segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Capítulo 7 - Amuleto


-- (Ana) --

Assim que chegamos ao quarto a Inês mandou-se logo para cima da cama.

- Eu amo ter as tardes livres! – Exclamava ela, soltando um suspiro.

- Sabe optimamente bem, principalmente antes das quartas, assim sempre dá para ensaiar para o teatro. Por falar nisso… Não viste o meu dossier onde tenho algumas falas? – Perguntei remexendo nas minhas coisas há procura dele.

- Hum… Não. Já procuras-te naquelas caixas? – Disse a Inês apontando para uns caixotes no canto do quarto.

Ainda estávamos nos primeiros dias, por isso muitas das coisas ainda não estavam nos seus lugares. O que me fazia perder um bocado. Depois de procurar em alguns caixotes finalmente encontrei. Fui-me sentar na minha cama, encostei-me há parede a decorar o texto. Passados alguns minutos, estava eu muito concentrada quando a Inês me interrompe.

- Queres ajuda?

- Hã?! Com o quê? – Perguntei confusa.

- Com isso… As falas.

- Ah, não, obrigada, não te quero maçar.

- Ai anda lá, não maças nada, eu ajudo. – Levantamo-nos as duas. Dei-lhe algumas folhas e começamos.

Era impossível parar de rir.

- Ahahah! Eu acho que tu também devias fazer a audição para a peça da escola.

- Só se entrar um bobo da corte no espectáculo. – Dizia ela a rir-se.

- Olha… Nunca se sabe.

- Está bem, está bem, então se precisarem, fala lá com o encenador. – Ironizou. Piscou-me o olho e continuamos a rir. – Vá… Agora a sério… -
Disse ela colocando uma postura séria. – Não é que precises de muito mais ensaio, porque já ficaste com o papel principal, como é óbvio, mas vá, vamos continuar para deixares todos encantados.

- Oh, que tola Inês. – Disse envergonhada.

- Realista minha cara amiga. Realista. – Entoou ela como se estivesse a dizer uma deixa o que me fez rir. – Ana… - Chamou-me antes de voltar-mos ao ensaio.

- Sim Inês…

- Hum… Passa-se algo entre ti e o Louis? – Perguntou envergonhada.

- INÊS! – Exclamei eu. – Gostas dele?!

- ACHAS?? Não… NÃO! Eu?! NÃO! Então só conheço o rapaz há 2 dias. Que disparate. Nada disso. Mas como vocês são muito ‘íntimos’ eu não sei, não quero que te chateies comigo por causa disso.

- Por causa de gostares dele?

- EU NÃO GOSTO DELE!

Não consegui aguentar mais e acabei por me perder em risos.

- Estás-te a rir do quê? – Perguntou a Inês confusa. – Não tem piada! Já viste, tu conhecesse-o há anos e depois chega aqui uma qualquer…

- Inês… O que é que aconteceu ao certo lá na arrecadação? – Interrompia, com pensamentos maliciosos.

- NADA! ANA?! – Perguntou estupefacta. Peguei numa mini almofada que tinha em cima da cama e mandei-lhe.

- Devias ter visto agora a tua cara, até mudaste de cor.

- Sua safada! – Disse atirando-me de novo com a almofada e ali começou uma mini ‘guerra’.
 
*****

 No dia seguinte, dirigi-me ao anfiteatro da escola para a minha audição: estava super nervosa e a tremer dos pés à cabeça, mas a Inês tinha conseguido animar-me e dar-me alguma coragem.

Quando cheguei, reparei que já havia imensa gente sentada; sentei-me o mais atrás possível e sozinha, enquanto respirava fundo e revia as minhas falas

- Bem-vindos! – Saudou a Mrs Darvus, entusiasmada como de costume. – Bem-vindos meus futuros actores, meus raios de Sol!

Tive de tentar não me rir daquela excitação toda.

- Hoje vamos ver quem tem realmente sangue dramático a correr pelas veias! Espero que não se esqueçam que o nosso Colégio tem sempre sido aclamado pelos jovens actores que aqui se estreiam… espero muito de vós!

Todos os alunos ali presentes aplaudiram e a Mrs Darvus foi sentar-se na primeira fila.

- Primeira audição… Katherine Charles, pode subir ao palco!

Quase tive de conter o vómito: a miúda mais mimada da escola subiu ao palco com uns saltos altos rídiculos (devo dizer que a imaginei a cair e a partir qualquer coisa) e começou a fazer… qualquer coisa. Qualquer coisa que não era de certeza uma audição. Ela era horrível.

- Muito bem, muito bem, querida. – Interrompeu a Mrs Darvus, obviamente aborrecida com aquela actuação. – Podes sair.

Ela fez uma mini vénia (a sério? Que ridícula!), sorriu e saiu do palco.

- A seguir, a seguir… - Ela parecia estar a revirar alguns papéis. – Josh Hutcherson. Pode subir.

O meu coração deu um inesperado pulo ao vê-lo subir ao palco: não acredito que me tinha esquecido que ele adorava Teatro!

Observei-o com muita atenção enquanto se preparava; ele fechou os olhos e começou.

- Há quem diga que todas as noites são de sonhos. Más há também quem garanta que nem todas, só as de verão.

Reconheci imediatamente aquela passagem de ”Um Sonho de Uma Noite de Verão” de Shakespeare; continuei a ouvir atentamente.

- No fundo, isso não tem importância. O que interessa mesmo não é a noite em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre, em todos os lugares, em todas as épocas do ano, a dormir ou acordado.

Ele continuou a declamar enquanto eu o ouvia, fascinada; quando terminou, todos aplaudiram e eu não pude evitar ruidosas palmas e assobios de aprovação – ele tinha arrasado completamente e ainda me sentia com pele de galinha.

- Excelente, EXCELENTE! –  A Mrs Darvus aplaudia com energia. – Muito bem! Pode descer, meu querido!.

O Josh sorriu e desceu, mas em vez de se sentar onde estava antes, mesmo lá à frente, veio sentar-se ao meu lado.

- Não me avisaste que estavas aqui – Disse ele, sorridente. – Só te vi mesmo agora, lá do palco.

- Desculpa. – Fiz uma careta – Mas estou tão nervosa que mal consigo pensar no que estou a fazer.

- Não te preocupes, aposto que vai correr lindamente.

- Não sei… - Respondi, com um embrulho no estômago. – E se me engasgar?! E se me esquecer do que vou dizer?! Ou pior, se fizer uma autêntica figura de ursa, como a Katherine fez?!

O Josh riu com vontade e eu dei-lhe um pequeno murro ao de leve no braço.

- Não estou a brincar!

- Desculpa, desculpa. – Ele parou de rir, ainda divertido – Ouve. Vais arrasar, eu sei que vais.

- Ana Jones? – Ouvi a Mrs Darvus a chamar. – Pode subir.

- Oh bolas, sou eu! – Dei um mini gritinho e saltei na minha cadeira. – Não sei se estou preparada!

- Hey, hey, calma!

Ele levou a mão ao bolso e tirou de lá uma pulseira com um pequeno sol.

- Comprei isto em criança e sempre foi o meu amuleto da sorte. – Ele pôs-mo na mão – Leva-o para o palco. Vai ajudar-te a teres mais confiança.

- Josh… - Disse eu, atrapalhada. – Eu não sei o que dizer…

- Não digas nada. – Ele piscou-me o olho. – Leva-o e parte uma perna.

Ia tentar recusar quando ouvi Mrs Darvus a chamar novamente.

- Ana Jones?

Respirei fundo e subi até ao palco; olhei para a plateia e engoli em seco – aquilo era mais difícil do que eu pensava.

- Pode começar, querida. – Disse gentilmente a professora de Teatro.

O meu primeiro pensamento foi fugir. – Mas estaria a ser uma autentica cobarde se desistisse do que gostava de fazer por ter medo. Por isso, olhei para o sol do Josh, fechei os olhos e comecei a declamar uma das minhas passagens favoritas da Julieta Capuleto.

- Meu inimigo é apenas o teu nome. Continuarias sendo o que és, se acaso Montéquio tu não fosses…

Abri os olhos lentamente e olhei em frente, tentando pôr-me no papel da apaixonada de Romeu.

- Que é Montéquio? Não será mão, nem pé, nem braço ou rosto, nem parte alguma que pertença ao corpo. Sê outro nome. Que há num simples nome? O que chamamos rosa, sob uma outra designação teria igual perfume…

Os meus olhos passaram pelo Josh, que parecia fixado em mim.

- Assim Romeu, se não tivesse o nome de Romeu, conservaria a tão preciosa perfeição que dele é sem esse título. Romeu, risca teu nome e, em troca dele, que não é parte alguma de ti mesmo, fica comigo inteira…

Terminei e fechei os olhos novamente, com receio de enfrentar o público.

- Foi… foi magnífico!

Abri os olhos, surpreendida, e vi a Mrs Darvus a limpar uma lágrima ao canto do olho; vi os outros colegas a aplaudirem e vi a Katherine a fulminar-me com o olhar, obviamente irritada; mas, acima de tudo, vi o Josh a aplaudir-me em pé, com entusiasmo.

Agradeci baixinho e fui sentar-me novamente.

- Por que é que estavas nervosa?! – Perguntou-me o Josh, entusiasmado. – Foste brilhante! Foste espectacular, foste incrível, foste… foste…!

Quando se apercebeu que ainda não tinha parado de falar, corou; sorri-lhe timidamente.

- Obrigada. – Respondi, tentando não parecer muito envergonhada. – As tuas palavras foram importantes… e o teu amuleto deu-me coragem.

Ele sorriu.

- Ainda bem que pude ajudar…

Ficámos a olhar um para o outro durante algum tempo até começarmos a rir baixinho, embaraçados.

- Bem, não tenho dúvida alguma de que vais entrar, Julieta. – Disse o Josh, confiante.

- Não sei. – Sorri-lhe. – Mas tu vais, de certeza.

- Então e que tal se entrarmos os dois? – Perguntou ele, divertido. – Parece-te bem?

 Sorri-lhe novamente.

- Parece-me óptimo.

E olhámos novamente para o palco, onde um rapaz fazia a sua audição.

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